Mensagem de D. Alberto Taveira - “A diferença”

fevereiro 19, 2011

A violência que se espalha em todos os quadrantes do mundo, seja de ordem política e social, religiosa ou racial, tem em sua origem o mistério do pecado, do qual somos tributários, em níveis diversos, e todos igualmente chamados à mudança, cujo nome é conversão. Violência é também a competição avassaladora, com a qual as pessoas utilizam as outras ou recorrem a expedientes desonestos, desde que alcancem as metas fixadas ou, em outros níveis, simplesmente a ilegalidade que impera, por exemplo, nos cartéis do tráfico de drogas. A violência pode estar nas esquinas de nossas ruas ou dentro de nossas casas.
O Evangelho propõe uma novidade de vida a partir das relações pessoais, para chegar às transformações sociais mais amplas. É ilusório aguardar uma nova sociedade sem homens e mulheres que assumem práticas diferentes em seu relacionamento cotidiano. No Sermão da Montanha, a Carta Magna do Reino de Deus, algumas recomendações apontam a diferença de comportamento a que são chamados os cristãos (Mt 5, 38-48), para suscitarem as mudanças pelas quais todos anseiam, muitas vezes sem saber dar-lhes um nome adequado.
O “olho por olho e dente por dente” não era, já no Antigo Testamento, uma tabela de ofensas permitidas, mas antes um limite educativo, destinado à superação da agressividade. Jesus vai além, ao propor a não resistência ao malvado. “Se alguém te bater na face direita, oferece-lhe também a esquerda! Se alguém quiser abrir um processo para tomar a tua túnica, dá-lhe também o manto! Se alguém te forçar a acompanhá-lo por um quilômetro, caminha dois com ele”! A superação das medidas humanas é altamente provocante. Que digam os praticantes de esportes radicais! Um bom treinamento cotidiano pode ajudar a melhorar as marcas no caminho da prática da caridade. A violência do mundo começa a ser vencida por pessoas dispostas à generosidade e ao perdão, sem limites prévios!
“Dá a quem te pedir, e não vires as costas a quem te pede emprestado”. Pessoas, instituições e países pobres sabem o que custa um “não”. Pessoas que efetivamente passam fome ou que vagam meses a fio em busca de um emprego têm histórias para contar ou são elas mesmas histórias trágicas! Uma massa de homens e mulheres famintos tem potencial altamente explosivo. Nossa contribuição para que não se chegue a uma indesejada onda de saques, como aparecem tantas nos noticiários, começa na porta de casa!
“Ouvistes que foi dito: ‘Amarás o teu próximo e odiarás o teu inimigo! ‘Ora, eu vos digo: Amai os vossos inimigos e orai por aqueles que vos perseguem”! Toca-se aqui o núcleo da revolução evangélica. Amar o inimigo é fruto da graça de Deus que opera nos corações. Em menos de dois meses, o mundo assistirá a beatificação de João Paulo II, em cuja biografia consta nada menos do que a visita ao criminoso que tentou eliminá-lo com uma arma de fogo. O inimigo tornou-se próximo a ser amado! Para chegar a tais alturas, desenvolva-se em nós a chamada espiritualidade de comunhão, proposta pelo grande servo de Deus, verdadeira arte de amar. Em primeiro lugar, ter o olhar do coração voltado para o mistério da Trindade, que habita em nós e cuja luz há de ser percebida também no rosto das pessoas que estão ao nosso redor. Significa a capacidade de sentir o outro como um que faz parte de mim, para saber partilhar as suas alegrias e os seus sofrimentos, para intuir os seus anseios e dar remédio às suas necessidades, para oferecer-lhe uma verdadeira e profunda amizade. É ainda ver antes de tudo o que há de positivo no outro, para acolhê-lo e valorizá-lo como dom de Deus, um dom para mim. Trata-se ainda de criar espaço para o irmão, levando os fardos uns dos outros (Cf. Gl 6,2) rejeitando as tentações egoístas que sempre nos insidiam e geram competição, carreirismo, suspeitas, ciúmes. Não haja ilusões! Sem esta caminhada espiritual, de pouco servirão os instrumentos exteriores de relacionamento e comunhão (Cf. Novo Millenio Ineunte 43).
Enfim, a superação da violência no mundo tem seu segredo revelado quando se olha para o Céu, na perfeição do Pai, que não é perfeccionista ou detalhista, mas ama a todos, “pois ele faz nascer o seu sol sobre maus e bons e faz cair a chuva sobre justos e injustos”. E Jesus, o Filho amado do Pai, que é perfeito no amor, ainda nos oferece detalhes: “se amais somente aqueles que vos amam, que recompensa tereis? Os publicanos não fazem a mesma coisa? E se saudais somente os vossos irmãos, que fazeis de extraordinário”? Na diferença está nossa contribuição positiva! O mundo pode efetivamente ser melhor porque existimos.

fonte: Jornal Voz de Nazaré

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